[ Descrição de desafios editorias na tradução e adaptação].

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Relatos de experiência de tradução – Equipe Unicamp

Discente supervisora do projeto:
Samira Spolidório

Participar do projeto de tradução do OBOS tem sido uma fonte de grande satisfação pessoal para mim. Estou envolvida com o estudo e a prática da tradução voluntária desde a época que comecei meus estudos em tradução, já que meu TCC da especialização e depois minha dissertação de mestrado trataram de tradução voluntária feita por fãs (fansubbing), e também fiz várias legendas e traduções voluntárias para causas/organizações/instituições com as quais me identifico. E eu me identifico muito como movimento feminista e com as questões da saúde da mulher que, por razões pessoais, se tornaram ainda mais cruciais para mim nos últimos dois anos. Então esse trabalho preenche um ‘vazio existencial’ em relação a realização pessoal e profissional que trabalhar com a tradução de aplicativos de celular e legendagem de vídeos da Red Bull não me dão.

Apesar de experiências prévias com tradução voluntária, a participação em um trabalho desse porte e volume foi a primeira vez. E também a primeira vez que atuei como gerente de projetos, ajudando no planejamento e na preparação do projeto de tradução que foi apresentado às autoras para “vender nosso peixe” e mostrar que “voluntário” para nós não significa “de qualquer jeito” (da mesma forma que minhas experiências anteriores também não tinham nada de “de qualquer jeito”), a preparação dos documentos (que reconheço, foi um dos pontos mais falhos dessa primeira fase e que eu já sei como melhorar para a segunda etapa) ajudando outros tradutores a entender a plataforma (ainda que eu saiba que isso também pode ser melhorado e otimizado) e de fato lendo e revisando os textos de temas que são tão importantes e interessantes para mim e com os quais sempre aprendo muito.

Eu gostaria de ter percebido antes o problema com a formatação dos arquivos originais e evitado as dores de cabeça dos tradutores (afinal essa é a função de um gerente de projetos) e também de ter tido a oportunidade de ajudar mais na padronização dos textos finais enviados para a revisão técnica fazendo uma revisão linguística e de tradução antes (que é uma atividade que eu gosto muito de fazer), porém o fato da primeira fase ter coincidido com o meu período de doutorado sanduíche acabou limitando um pouco a minha participação em relação ao que eu esperava poder ter contribuído.

Seguindo em frente, espero poder fazer parte mais ativamente do grupo de revisão linguística dos capítulos já traduzidos e de poder dar mais apoio aos tradutores durante a nova etapa de tradução. Também estou muito animada com a vinda da Judy e da Norma para a Unicamp!

Capítulo 1 – Our Female Bodies: Sexual Anatomy, Reproduction, and the Menstrual Cycle

Tradutor: Frederico DeNez

O ato de traduzir é sempre complexo. Requer, talvez, saber de antemão a prédica clássica derridiana – mesmo que de modo inconsciente – “eu só tenho uma língua e ela não é minha”, para, em uma certa medida, estarmos abertos ao processo intrincado de tessitura desta trama que inter-fere nos desejos e significados de uma linguagem outra. Traduzindo textos de Jacques Lacan já há alguns anos, percebi, desde o início, os desafios em verter idiomas da língua de saída para uma língua de chegada a qual, grande parte das vezes, não comporta tudo aquilo que o Outro nos comunica.

A experiência com as traduções da OBOS não foi diferente: um mecanismo desafiador e instigante, em especial pelo fato de trabalhar com ferramentas e métodos que um tradutor “à moda antiga” feito eu estava desacostumado, como glossários online e discussões em grupo sobre as melhores escolhas para determinadas expressões na versão final do texto – situações que foram engrandecedoras como profissional e como sujeito diante de discursos de Our Bodies, Ourselves, cuja temática nos é de valiosa importância para o esclarecimento da saúde da mulher em variados aspectos. Sinto-me grato e feliz por ter participado desta primeira fase desta tradução.

Tradutora: Giulia Mendes Gambassi

Um dos primeiros pontos que destaco sobre minha experiência traduzindo o primeiro capítulo de Nossos corpos por nós mesmas é a percepção da necessidade desse tipo de conteúdo para amplo acesso das mulheres independentemente de classe, visto que mesmo tendo acesso à informação – considerando as oportunidades de educação que tive em minha vida – aprendi e descobri muitas coisas sobre meu próprio corpo e sobre a saúde feminina em geral ao ler e traduzir o material. É importante, então, salientar e destacar a relevância social desse projeto de tradução que tem se consolidado com uma equipe diversa e voltada às questões que as mulheres encontram na sociedade em que vivemos.

Nesse sentido, o segundo ponto de destaque se dá devido à minha experiência subjetiva durante o processo tradutório, em que resgatei algumas memórias relacionadas ao meu corpo, dentre elas, lembranças traumáticas da infância. Mais uma vez, então, destaco a importância da discussão que esse material pode trazer, considerando o tabu que ainda envolve o corpo feminino e sua sexualidade.

Além disso, algumas questões de cunho mais técnico foram encontradas e enumero-as a seguir:

  1. Optamos por ato sexual ao invés de relação sexual, visto que nem todo ato é consentido ou prevê um relacionamento anterior a ele.
  2. Tivemos algumas preocupações com marcações de gênero, visto que português não é uma língua neutra, então modalizamos sempre que possível, já que a genitália feminina não está necessariamente vinculada a uma identidade de gênero feminina.
  3. Pontualmente, tivemos alguns impasses quanto à tradução de gírias para menstruação. My cicle, my red friend, the curse, aunt flo e on the rag foram traduzidas como meu ciclo, chico, a praga, aqueles dias e estou só o pó.
  4. Outra questão pontual foi o trocadilho feito com a palavra menarkee (MEN-are-kee), que não conseguimos trazer para a tradução em português.
  5. Por fim, a palavra abused pode ser traduzida tanto como agredida quanto como abusada, então fizemos marcações para decidirmos como ela será traduzida em circunstâncias em que ambas as traduções são possíveis.

Capítulo 9 – Birth Control

Tradutora: Louise Hélène Pavan

Muito já foi falado a respeito da impossibilidade de uma tradução neutra. Apesar de ainda existir, atualmente, quem acredite em uma tradução imparcial, livre de interpretações múltiplas, inequívoca e transparente, sabemos que aquele que traduz imprime no texto marcas de si, de sua subjetividade e de seu modo de pensar e enxergar o mundo. Traduzir é um ato de construção em constante mudança. Construção de novos significados e sentidos, em uma eterna tentativa de tradução de uma totalidade que é cambiante e, que nos esforços de passagem de uma língua para outra, se transforma, se perde, se acomoda, mas também cria algo novo, abre o horizonte para o contato com o outro, com o estranho e com o inesperado. A tradução promove o encontro entre línguas e culturas, construindo realidades identitárias. Por isso, não se pode dizer que ela é um ato desinteressado e inocente. Pelo contrário, está imersa em jogos de poder, de representações e de negociações entre realidades distintas.

É assim que entendemos a tradução do livro Our Bodies, Ourselves, que se encontra em andamento no Brasil. Publicado pela primeira vez em 1970, em inglês, o livro é resultado do interesse de um grupo de doze mulheres que tinham uma ambição em comum: transmitir conhecimentos para outras mulheres que quisessem aprender sobre si mesmas. Por meio de um formato acessível, o livro é detalhado e didático, possui uma linguagem compreensível, mesmo quando aborda assuntos mais técnicos, atingindo seu objetivo de compartilhar informações sobre médicos, procedimentos, acesso à saúde e de estimular a modificação de práticas, incentivando mulheres a se compreenderem e a entenderem a importância da autonomia da sexualidade feminina. Desde então, o livro já foi traduzido e adaptado para mais de 31 línguas, impactando pessoas do mundo todo.

Como podemos ver, a simples publicação do livro Our Bodies, Ourselves já pode ser considerada um ato de resistência e de tentativa de colocar assuntos considerados tabu diante dos olhos da sociedade. Falar sobre a sexualidade feminina sem ter de usar expressões metafóricas, sem se submeter a uma realidade machista e sem deixar o debate para o segundo plano era naquele tempo inimaginável. Mulheres no centro da discussão, falando sobre seus corpos de maneira explícita, com imagens – para compreensão mais aguçada –, tratando sobre sexualidade, sobre as diversas formas de nos protegermos, sobre abuso e aborto, foi uma ousadia, como bem assinalam as autoras no site: “In 1970, a group of women in the Boston area self-published “Women and Their Bodies,” a 193-page booklet that dared to address sexuality and reproductive health, including abortion”. Porém, ousadia necessária, arriscamos dizer.

O acontecimento de Our Bodies, Ourselves, assim como sua tradução para dezenas de línguas, inclusive agora para o português, em termos derrideanos, assinala uma ruptura, assinala o inesperado que causa espanto e que, ao mesmo, vem para transformar. Transformar aqueles que escrevem, aqueles que leem e aqueles que traduzem. Mobilizar pessoas que se debruçam na árdua tarefa de tradução independente de fronteiras. Campinas, Rio de Janeiro, Estados Unidos. Letras, medicina, coletivo feminista. Equipes que mesmo distantes dialogam para fazer acontecer, enquanto não ganham “nada” para isso. Nada em termos financeiros, mas muito no encontro com a alteridade, com a heterogeneidade cada vez mais necessária. Compreendermo-nos enquanto seres humanos passa pela necessidade de compreendermos também o outro, e a tradução é um espaço privilegiado para circularmos pelas línguas e pelo estranho, que, no final das contas, como diria Kristeva, nos habita. A tradução é um espaço pelo qual podemos ver o outro, esse estranho que parece tão distante. É somente por meio dela que conseguimos ter contato com algo desse outro que nos escapa, e o que há de mais enriquecedor do que isso?

As motivações para a tradução voluntária podem ser muitas, mas, arriscamos dizer que, em comum, está a vontade de fazer diferente, de fazer o livro se tornar acontecimento também aqui Brasil. Acontecimento que choca, incomoda, faz pensar, mas que, por isso mesmo, toca, sensibiliza, faz sentir na pele e acarreta alguma modificação. Apesar de voluntária, não quer dizer que não é dedica, que não possui uma rede de agenciamento e de planejamento muito detalhada para acontecer. A troca é inerente ao projeto, as concepções de mundo devem ser dialogadas e negociadas para que acordos sejam estabelecidos e sigamos com uma tradução que é, sim, perpassada por escolhas que refletem e deixam escapar a nossa visão de mundo. Acreditamos que a escolha específica desse livro e a missão que nos colocamos de traduzi-lo já diz muito sobre nós mesmos e sobre quem somos.

Assim, enquanto acontecimento que desacontece para reacontecer, Our Bodies, Ourselves causou espanto e foi difundido para diversos locais do mundo, ousando não somente por conta das informações técnicas, mas, em especial, pelos relatos de experiência de mulheres reais, com histórias que se repetem todos os dias, não apenas nos Estados Unidos. Histórias que podem construir empatia, diminuir a competitividade entre as mulheres e assinalar que não estamos sozinhas. O compartilhamento tanto desses relatos quanto de informações sobre a saúde é o que nos inspira. Também queremos compartilhar, também queremos fazer parte da construção de uma rede de sentidos por meio da tradução, uma vez que a tradução é construção, como bem assinalamos no início deste texto, não é mesmo? A construção da tradução (por muitas mãos, como é o caso da tradução brasileira) é muito mais do que a publicação de um livro em português. É a afirmação de um posicionamento.

Traduzir Our Bodies, Ourselves, portanto, em dias atuais, também é um ato de resistência. Mais do que isso, é uma tentativa de disseminação de conhecimento e de esperança por tempos melhores, tanto do ponto de vista político, cultural, mas, principalmente, do ponto de vista humano. Poder falar abertamente em sala de aula sobre aborto, menstruação, violência contra a mulher, auxilia-nos a imergir no texto e a nos posicionarmos diante dos dilemas tradutórios que um livro como esse exige que façamos enquanto tradutores que defendem uma causa: a causa feminista. Lembro-me de em uma reunião estarmos discutindo, com a porta da sala de aula aberta, sobre os diversos métodos contraceptivos e as possíveis nomeações em inglês e em português para a palavra camisinha. Uma das professoras comentou, em tom de brincadeira, o que uma pessoa qualquer que estivesse passando do lado de fora – e, portanto, não tivesse nenhuma contextualização do que estava acontecendo do lado de dentro – pensaria. Pensaria na balbúrdia, é claro.

E quem somos nós, tradutores, nessa balbúrdia toda? Uma mão que aperta as teclas do computador e imprime um pouco de si na subjetividade da tradução do livro, uma boca que participa de reuniões e pronuncia com sotaque as palavras em inglês, um corpo que aprende e se (des)constrói para se compreender no mundo e compreender a importância de um livro como esse para a sociedade. Continuemos, portanto, a fazer nossa balbúrdia dentro da universidade pública.

Tradutora: Marcella W. Stefanini

A tradução de um dos capítulos do livro Our Bodies Ourselves foi uma experiência muito enriquecedora, especialmente por ter sido realizada em grupo. A possibilidade de conversar com o grupo sobre nossas dúvidas e pensarmos em soluções juntos foi muito significativa para mim, que estudo tradução, mas não tenho muita experiência prática. Além disso, essa troca permitiu a reflexão acerca de questões linguísticas que apenas a tradução torna possível, como a questão do gênero, que em inglês, muitas vezes, não é marcado, mas em português costuma ser. Nesse sentido, a tradução de palavras como “doctor” e “health care provider” precisaram ser pensadas a fim de promover a inclusão de gênero.

Relacionada a isso, a temática do livro tornou a tradução ainda mais estimulante, visto que muitas das informações ali contidas eram desconhecidas por mim até então, e foi muito importante, como mulher, aprender mais sobre o corpo feminino e, no caso do capítulo traduzido, sobre as opções de métodos contraceptivos, especialmente as vantagens e desvantagens de cada método. Apesar de estudarmos o corpo humano e termos aula de educação sexual na escola, somadas aos esclarecimentos sobre contracepção oferecidos por profissionais da saúde, alguns dos métodos apresentados são poucos conhecidos, visto que os mais comuns para nós são a pílula e a camisinha. Nesse sentido, cabe destacar, em relação ao processo de tradução, a necessidade de realização de uma pesquisa mais detida a fim de encontrar a tradução brasileira para o método “cervical cap”, uma vez que se trata um método pouco utilizado no Brasil e pouco citado em materiais sobre métodos contraceptivos.

A partir desse pequeno exemplo, percebeu-se a importância de a mulher conhecer seu corpo e as questões que o envolvem (como a contracepção), a fim de se empoderar dele e poder fazer as escolhas que lhe sejam mais apropriadas a partir desse conhecimento. Em relação à contracepção, isso se revela muito claramente. Apesar da importância do/a profissional da saúde para esclarecer e orientar a mulher acerca dos métodos contraceptivos, percebo, por experiência própria, que não há uma discussão sobre todos os métodos a fim de que se decida em conjunto, mulher e profissional, o método mais apropriado. Essa discussão costuma estar centrada em alguns poucos métodos, como os citados, camisinha e pílula, mais comuns, passando por alguns outros, como o DIU e o adesivo. É possível que a escolha desses métodos em particular e não de outros esteja relacionada a fatores como facilidade de acesso, entretanto, acredito ser fundamental que a mulher tenha conhecimento dos variados métodos a fim de poder ter um papel mais ativo nas escolhas que dizem respeito ao seu corpo. Essa reflexão só se tornou possível para mim a partir do projeto, da leitura e da tradução do capítulo.

Capítulo 12 – Unexpected Pregnancy
Capítulo 25 – Environmental and Occupational Health

Tradutor: Carlos César da Silva

A experiência de tradução para a OBOS foi muito enriquecedora – tanto pelo trabalho em grupo e esforço coletivo de todas as pessoas envolvidas no projeto quanto pela importância dos temas discutidos. A iniciativa das professoras organizadoras de parear tradutoras com tradutores para evitar colocações problemáticas e/ou inadequadas foi muito proveitosa e tranquilizante considerando a seriedade dos textos. Tendo sido parte da tradução de dois capítulos, um entre quatro pessoas e outro em dupla, tive algumas experiências de contratempos por dividir a responsabilidade com outras pessoas, mas tudo foi resolvido com muita reciprocidade e comprometimento de todos os componentes das equipes.

O Capítulo 12, traduzido em dupla, foi o mais tranquilo tanto pela interação interpessoal quanto pela sutileza da escrita do capítulo, apesar do tema forte. Minha parceira foi sempre solícita em me auxiliar nas dúvidas referentes ao vocabulário apropriado e também com a indicação de fontes confiáveis para a adaptação dos dados estadunidenses sobre gestação para o contexto brasileiro.

O Capítulo 25, por sua vez, propôs muitas dúvidas ao quarteto, principalmente pela quantidade de informações específicas dos sistemas legislativos dos Estados Unidos em relação ao ambiente de trabalho e ao controle de produtos tóxicos. Em específico, o termo “pesticides” foi o que mais causou discussões no grupo, considerando que em inglês ele é empregado de maneira geral a substâncias químicas – como agrotóxicos – enquanto em português, a tradução literal “pesticida” costuma ser mais restrita a venenos contra pragas. 

Tradutora: Carolina Gomes da Costa

O processo de tradução do livro Our Bodies Ourselves foi uma experiência enriquecedora para a minha formação acadêmica, como tradutora, pessoa e mulher.

Com esse trabalho tive contato com pessoas do grupo da pós-graduação, contato com assuntos pertinentes para a vida e, junto de tudo isso, desenvolvi esse trabalho voluntário de tradução.

 Realizei a tradução de dois capítulos, um em dupla e outro em um quarteto. A experiência entre a tradução desses capítulos foi diferente. No capítulo 12, Unexpected Pregnancy, eu e minha dupla conseguimos nos organizar mais facilmente e o processo de tradução foi mais rápido e eficiente. Porém, a tradução do capítulo 25, Environmental And Occupational Health, foi mais complexa pois tinha mais pessoas para enviar os arquivos e terminar a tradução, isso atraso nos envios das partes. Além disso, problemas na comunicação entre o grupo ocorreram.

Já a ferramenta SmartCat nos proporcionou realizar a tradução em conjunto, usando a mesma memória de tradução e facilitando o arquivamento do projeto. No entanto, o uso da ferramenta também foi um desafio. Algumas funções e exigências do programa, como as tags e a organização do texto no SmartCat dificultaram um pouco o seu uso, mas com o grupo, conseguimos resolver as dúvidas e ter os textos traduzidos e formatados.

A tradução trouxe vários questionamentos, dúvidas em relação a como proceder em alguns momentos, como realizar a tradução com um grupo tão grande e mesmo assim manter a padronização dos pronomes, profissões, termos, o que acrescentar, tirar ou adaptar no texto. Entretanto, o resultado, até agora, nos permitiu prosseguir com a tradução e assim, melhorar nosso processo tradutório como grupo.

Capítulo 24 – Violence Against Women

Tradutora: Débora Andreza Zacharias

Não conhecia o trabalho do grupo Boston Women’s Health Book Collective e seu manifesto Our Bodies, Ourselves. Na Unicamp estou tendo a oportunidade de, mais do que apenas conhecer essa iniciativa, participar da tradução de Our Bodies, Ourselves para o português brasileiro, o que me alegra muito, pois não há em português um livro tão completo sobre a saúde da mulher e que traga tantas informações e referências.

Por ser um livro muito completo, é necessário que haja o envolvimento de profissionais de diversas áreas: tradutores, revisores, revisores técnicos das áreas de saúde e direito, além da presença de um coletivo feminista para fazer as adaptações culturais necessárias para que a tradução traga informações importantes, e específicas, para as mulheres brasileiras.

Somos vários, tradutoras e tradutores, empenhados nesse projeto. Meu grupo de tradução tem quatro profissionais: Eduardo Rorato de Oliveira, Gislaine Assumpção, Juliana Gimenes, e eu Débora Andreza Zacharias. Além da tradução, ficamos com a responsabilidade de revisar o trabalho uns dos outros. O tema que escolhemos para traduzir foi Violência contra a mulher.

Esse capítulo é especialmente importante pelo momento que vive o país, no qual, de acordo com o 13° Anuário Brasileiro de Segurança Pública (Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2019), com dados registrados no ano de 2018, 66 mil casos de estupro ocorreram, 180 por dia. Também de acordo com o Anuário, mais da metade das vítimas tem menos de 12 anos e a maioria delas conhece seu agressor; das vítimas que dizem conhecer seu agressor, 42% também disseram que a violência era recorrente, o que mostra que um dos principais lugares de agressão é dentro da própria casa da vítima, com 13 mil registros de violência. Os dados ainda mostram que, tanto no número de vítimas de estupro como de feminicídio, houve um aumento de 4%, com mais de 1.200 mulheres assassinadas, principalmente por seus companheiros ou ex-companheiros. No Brasil há uma denúncia por violência doméstica a cada dois minutos.

Esses dados oficiais mostram que, mais que necessário, é urgente dar informações para que as mulheres conheçam mecanismos de defesa e denúncia contra a violência.

Essa realidade cruel do Brasil aumenta mais a nossa responsabilidade como tradutoras e tradutores em mostrar, através do texto que estamos traduzindo, meios legais para a defesa das mulheres, conscientizando todas e todos os leitores que elas e eles têm direito à proteção.

Nós, como grupo de tradutores conversamos várias vezes sobre a importância do nosso trabalho. Cada reunião feita para discutir o trabalho de tradução de Our Bodies, Ourselves também trazia uma reflexão sobre a mulher na sociedade; sobre como essa sociedade trata mulheres e sobre nosso papel do tradutor como agente político pode contribuir para transformar uma sociedade. Toda tradução estabelece uma relação de poder, cada escolha tradutória, expõe essa relação, na qual o tradutor é o agente máximo e pensar a tradução é dever do tradutor, pensar sobre suas escolhas, sobre seu projeto de tradução e pensar, principalmente, em como essas escolhas afetam as culturas que ele está colocando em contato.

Como profissionais de tradução em um trabalho voluntário, portanto, escolhido, nós, tradutoras e tradutores envolvidos no projeto de tradução de Our Bodies, Ourselves para a realidade brasileira, devemos ter consciência que nunca estamos fora da ação. Não estamos apenas entre línguas, estamos no centro do contato que elas estabelecem. Se colocarmos o tradutor apenas no in between, como diz Baker (2009), podemos acabar escondendo o papel político e social do tradutor e escondendo a responsabilidade de usar linguagem e tradução como ferramentas de transformação política. Podem existir muitas estratégias de tradução, mas cada uma acaba revelando as motivações, ideologias e atitudes do tradutor em relação ao texto, é importante lembrar sempre que o tradutor faz escolhas, e cada uma delas, tem um motivo de ser.

Quando, durante as reuniões em que discutimos a tradução de Our Bodies, Ourselves para o português do Brasil, escolhemos falar em primeira pessoa com as leitoras e leitores brasileiros, optamos pela aproximação do texto com seu público, optamos pela cumplicidade com quem lê. Em alguns trechos nos colocamos no próprio texto, usando a segunda pessoa do plural, nós, buscando personalizar esse contato com quem está lendo o texto. Outra escolha especial foi a de usar o feminino como sujeito, principalmente porque esse livro quer falar diretamente com as mulheres, quer informá-las, tirar suas dúvidas sobre sua própria condição feminina. O feminino precisa de voz em nossa sociedade.

Cada uma dessas escolhas tradutórias são escolhas políticas, baseadas em reflexões e que indicam a posição que temos em relação ao assunto discutido pelo livro: a vida e o corpo das mulheres, a vida feminina. A tradução não é mais que trocar uma palavra de uma língua por outra de outra língua, tradução também é se posicionar politicamente, principalmente em um trabalho voluntário de produção e de divulgação de um conhecimento que pode transformar a vida de pessoas e sociedade para melhor.

As histórias que contamos e recontamos, incluindo aquelas recontadas por meio de traduções, constituem um local onde exercitamos nossa atividade e, nesse sentido, elas são, em última análise, uma ferramenta para mudar o mundo. Elas nos permitem elaborar nossa identidade individual e coletiva e negociar as condições da história em que nos encontramos, seja como leigos, profissionais em um determinado domínio ou ativistas que exploram de forma consciente suas habilidades profissionais para efetuar uma mudança em âmbito local ou global (BAKER, 2009).

A história que contamos na tradução brasileira de Our Bodies, Ourselves está intrinsicamente ligada à realidade das mulheres no Brasil e a sua educação, informação e identidade. É preciso atenção à necessidade de haver uma concepção mais aberta de tradução para que seja possível um papel ético do tradutor de forma a evitar uma postura hegemônica e de dominação (Tymoczko, 2009), que têm raízes históricas, como nos processos de colonização, e político-econômicas hoje. O grupo Boston Women’s Health Book Collective, em todas as traduções de Our Bodies, Ourselves, deu liberdade para que fossem feitas adaptações culturais que tornassem o livro relevante para a realidade de cada país. É preciso ter consciência, principalmente nós, profissionais que trabalhamos com tradução, que posturas hegemônicas e de dominação podem ser responsáveis pelo apagamento de identidades, de culturas e de diferenças. Identidade não é um conceito estático, ela é complexa e com uma narrativa porosa, é construída politicamente, portanto, é tarefa do tradutor estar consciente dessa construção contínua e das transformações e influências que a tradução opera em culturas não hegemônicas. Mostrar a ética da diferença é papel do tradutor. Não podemos apagar a identidades em função de uma cultura hegemônica, principalmente nesse caso. Para que o livro seja relevante para as mulheres e para dar voz a todas as mulheres, devemos mostrar a identidade cultural real de cada país, incluindo características que façam parte da realidade feminina dos mais diferente lugares, mostrando políticas públicas e dando informações que enriqueçam a vida das mulheres e que deem ferramentas para que elas possam se proteger e refletir sobre sua realidade. Quando traduzimos, devemos pensar na identidade cultural das mulheres com quem estamos falando, como chegar até essas mulheres, quais são as informações necessárias para que elas tenham uma vida mais segura e consciente. Tudo isso é cultura, tudo isso é política.

Gostaria de terminar essa reflexão sobre nossa tradução de Our Bodies, Ourselves com a reflexão de Mona Baker em uma entrevista dada a Junia Zaidan no início do ano de 2019:

A tradução sempre desempenhou um papel fundamental no combate à opressão e à hegemonia em seus muitos disfarces, como é evidente em uma ampla gama de estudos que documentam a contribuição de tradutores e intérpretes à resistência contra o racismo, o fascismo, a colonização e a ditadura (RAFAEL, 1993; TYMOCZKO, 1999; ASIMAKOULAS, 2007; 2009). Atualmente, esse papel assumiu uma importância especial, dado o impacto da globalização e da interconectividade das lutas pelo mundo, e, para além da arena da prática, estendeu-se ao campo acadêmico (ZAIDAN; BAKER, 2019).

O projeto de tradução de Our Bodies, Ourselves é coletivo, voluntário, profissional, acadêmico, até mesmo o nome do livro em português foi escolhido coletivamente por todos nós: Nossos corpos, por nós mesmas. Estamos todos presentes nessa tradução e acreditamos que esse trabalho será de grande importância na vida de muitas pessoas, de mulheres que conhecerão mais seu corpo, sua sociedade e as leis existentes para protege-las, mulheres que poderão se elas próprias agentes de mudanças e multiplicadoras do conhecimento que está contido nesse livro tão completo sobre a realidade feminina podemos dizer agora, brasileira. tradutor está na área de contato entre culturas, povos e pessoas, está no limiar, no lugar em que o conflito é constante. Isso torna seu papel mais importante e torna o pensar a tradução ainda mais necessário. A tradução não é apenas entre línguas, ela abarca tudo, até aquilo que não se pode traduzir. O tradutor acolhe um texto que não é seu, um texto que ao mesmo tempo pertence e não pertence a ele, e produz o acontecimento que é o movimento de um texto para outra língua. Movimento. Tradução é movimento, identidade, cultura, cada elemento interferindo em cada escolha do tradutor.

Referências

  • BAKER, Mona. A tradução como um espaço alternativo para ação política. Trad. Cristiane Roscoe-Bessa, Flávia Lamberti, Janaína Araújo Rodrigues.  Cadernos de Tradução, v. 38, n. 2, p. 339-380, 2018.     
  • BAKER, M. Resisting state terror: Theorizing communities of activist translators and interpreters. In: Globalization, political violence and translation. Palgrave Macmillan, London, p. 222-242, 2009.
  • FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. 13 ° Anuário brasileiro de segurança pública. 2019.
  • TYMOCZKO, M. Translation, ethics and ideology in a violent globalizing world. In: Globalization, political violence and translation. Palgrave Macmillan, London, 2009. p. 171-194.
  • ZAIDAN, J. M.; BAKER, M. Tradução e transformação social: uma entrevista com Mona Baker. PERcursos Linguísticos, v. 9, n. 21, p. 14-35, 2019.

Tradutor: Eduardo Rorato

Traduzir nunca é um ato isolado de transferência ou transposição de significados de uma língua A para uma língua B. Por muito tempo acreditou-se que o sujeito tradutor poderia se desvencilhar do objeto traduzido, e que o tradutor pudesse manter-se neutro, afásico durante o processo tradutório. No entanto, sabemos da impossibilidade de o/a tradutor (a) ignorar suas idiossincrasias, experiências pessoais, ideologias e posicionamentos políticos.

Como um dos tradutores envolvidos no projeto de tradução da obra Our Body, Ourselves, pude corroborar essa impossibilidade de permanecer impessoal e passivo diante do texto que estava diante dos meus olhos, especialmente por tratar-se de um capítulo cujo título é “Violência Contra a Mulher”.

Além das dificuldades inerentes a qualquer processo tradutório que variaram desde questões culturais a decisões lexicais, as maiores dificuldades foram de cunho emocional. Isso porque minha mãe e minha irmã foram vítimas de violência doméstica causada pelo pai que frequentemente chegava bêbado em casa e as agredia covarde e gratuitamente quando eu ainda era uma criança. Inevitavelmente, lembranças e cenas desses episódios de violência viam à tona à medida que eu lia e traduzia o texto.

Acredito que o papel de todo (a) tradutor (a) como agente social é gerar algum tipo de reflexão e discussão que leva a mudanças no tecido social. Questões relacionadas a gênero, classe social, violência, preconceitos, por exemplo, devem ser abordadas pelo tradutor sempre que possível. Há muito a ser feito ainda, e precisamos evoluir em diversas frentes para que possamos nos tornar uma sociedade menos falocêntrica e mais igualitárias onde as mulheres possam usufruir os mesmos direitos que os homens, e principalmente serem respeitadas e devidamente protegidas de agressores covardes.

Dedico esse trabalho a você mulher sem a qual não há vida humana e cujo valor é inestimável. Deixo registrado nesse breve relato meu profundo e total repúdio a toda e qualquer tipo de violência contra qualquer ser humano, mas especialmente contra mulher. Esse trabalho representa minha pequena contribuição para a erradicação da violência contra a mulher.

Tradutora: Gislaine Cristina Assumpção

A minha experiência como tradutora de uma pequena parte do livro Our Bodies Ourselves foi muito singular. Eu e o Eduardo decidimos fazer juntos a tradução da primeira parte do capítulo “Violence Against Women” e a Juliana e a Débora ficaram com a segunda parte. A experiência de traduzir e revisar em grupo foi muito interessante, aliás, uma prática nova para mim. Com isso, tive ainda mais a certeza de que o ato de traduzir é sempre subjetivo, pois, apesar de ter sido um trabalho em grupo, com o uso de uma ferramenta, o Smartcat, as escolhas tradutórias são sempre pessoais e atravessam um caminho de reflexões antes de se tornarem definitivas. Porém, jamais imaginei que me envolveria tanto com uma tradução, mesmo porque eu nunca tinha traduzido nada do inglês e a língua inglesa não é uma língua com a qual eu me sinto tão à vontade, como acontece com o francês. Encontrei algumas dificuldades com relação à terminologia, como por exemplo no parágrafo que trata do “Gray Rape”. Essa expressão refere-se, segundo Laura Stepp, autora do artigo “A New Kind of Date Rape“, a um tipo de violação que ocorre por falta de comunicação clara entre a vítima e o agressor e em contextos de sexo casual, encontros, sinais não compreendidos, álcool etc. A decisão pela tradução “Estupro Cinza”, apesar de não ser usada no Brasil, se deu pela proximidade do uso da cor cinza para indicar falta de clareza, nebulosidade, também na língua portuguesa. No mais, deparei-me com outras pequenas questões que foram sendo esclarecidas durante nossas discussões às segundas-feiras.

Voltando ao título do capítulo, “Violence Against Womem”, e ao assunto que se desenvolve no decorrer das páginas, confesso que fiquei bastante incomodada quando comecei a ler para, em seguida, traduzir. Como mulher, senti como se o texto fosse um pouco meu também. Me coloquei no lugar daquelas mulheres que deram os seus depoimentos, que relataram as situações difíceis pelas quais passaram e me emocionei em diversos momentos. Como a maioria das mulheres, criadas em uma sociedade machista, eu não tinha noção de que a violência sexual não está somente no ato forçado de penetração. É muito mais do que isso.

Enfim, aprendi muito e pude comprovar que o tradutor inevitavelmente se envolve com o que traduz e certamente imprime sua historicidade na escrita, já que todo discurso é subjetivo e apresenta uma profunda participação de quem o produz.

Tradutora: Juliana Aparecida Gimenes

Participar da tradução do livro Our bodies, Ourselves tem sido uma experiência muito interessante tanto pessoal como academicamente. Vou destacar dois aspectos principais que mais me chamaram a atenção durante o trabalho: (a) um aspecto mais geral, ou seja, a tradução como uma necessidade de cunho social, político, cultural e (b) um aspecto mais específico, ou seja, o uso de ferramenta de tradução, especialmente o SmartCat.

Sobre a tradução voluntária

Acho importante destacar que essa foi a primeira vez que participei de um projeto de grandes proporções, envolvendo várias pessoas de diversos países. Não há dúvidas de que o livro OBOS é muito importante para a formação cidadã e sabemos que muitas mulheres, infelizmente, ainda não têm acesso às informações apresentadas, tanto de saúde, de direitos, de vida digna, etc.

Nosso grupo [Débora, Eduardo, Gislaine e eu] trabalhou com a tradução do Capítulo 24: Violência contra a mulher, um tema bastante delicado e sensível. Em alguns momentos a tradução foi bastante difícil, não pelo inglês, mas pelo tom dos relatos, pelas formas de violência e pelos maus tratos físicos e psicológicos que as mulheres sofrem pelo fato de serem mulheres.

Um caso que me chamou a atenção logo na primeira discussão que tivemos em sala foi que, enquanto os outros grupos comentavam sobre “coisas engraçadas” de algum ponto da tradução, todos riam e o clima era bem tranquilo, o nosso capítulo não permitia esse tipo de descontração. Em nenhum momento de discussão interna do nosso grupo surgiu qualquer tipo de descontração, de um clima mais leve. O capítulo 24 é bem denso e os relatos muito impactantes.

Sobre o uso do SmartCat

Como dito, essa foi a primeira vez que usei uma ferramenta de tradução. Entendo que as CAT tools ajudam na padronização, na construção de glossários, no gerenciamento das pessoas e na divisão em partes iguais do texto, o que facilita o trabalho em grupo, mas, particularmente, em muitos momentos preferiria ter traduzido no Word diretamente. Embora já tenhamos discutido em sala sobre a possibilidade de diagramar o texto antes de enviar para o Smartcat – projeto para a continuação do trabalho -, nessa primeira experiência, em alguns momentos, a ferramenta mais “atrapalhou” do que facilitou. Não excluo a possibilidade de ser uma falta de habilidade da minha parte (porque aprendi a mexer na ferramenta enquanto traduzia!). No momento em que estamos agora, na revisão final em Word, o trabalhou está fluindo mais facilmente.

Em termos gerais, a tradução do inglês para o português foi um processo tranquilo, pois, como dito em sala, o objetivo do livro é alcançar o maior número possível de pessoas, então, a escrita é simples, clara e direta. Talvez o que mais dê um pouco de trabalho seja a adaptação das leis do contexto norte-americano para o contexto das leis brasileiras.

Um exemplo de tradução que gerou discussão foi a escolha de “mulher agredida”, “mulher maltratada” ou “mulher vítima de violência” para “battered woman”. Não se trata de uma tradução “certa” ou “errada” aqui, mas aquela que conseguisse provocar uma sensação no/a leitor/a brasileiro/a como a que o texto em inglês provocou em nós. Há nuances diferentes entre “agredida”, “maltratada” e “vítima de violência”. Foram esses jogos de sentidos com os quais tivemos que lidar durante o texto.

Capítulo 25 – Environmental and Occupational Health

Tradutor: Leonardo Afonso

Foi uma experiência nova e um grande aprendizado participar da tradução de Nossos Corpos por Nós Mesmas (Our Bodies Ourselves). Como tradutor, já trabalhei com textos jornalísticos e, principalmente, literários; as premissas da tradução do livro são bem diferentes, e buscam uma comunicação simples e direta o mais possível. Olhando em retrospecto, uma escolha como “com demasiada frequência” para traduzir “too often” parece inadequada, muito presa ao literalismo e introduzindo uma expressão que na prática nunca é empregada, de modo que o mais simples “é muito frequente que” refletiria sem perdas a situação comunicativa com a vantagem de uma leitura mais fluida. Outro aprendizado tem sido o de manter vigilância sobre os condicionamentos linguísticos “machistas”, que são meus, da sociedade, e mesmo do código, que muitas vezes nos força a especificar o gênero onde no inglês ele é indefinido, e adota o masculino como um falso neutro, e buscar soluções que minimizem esse caráter patriarcal sem incorrer numa linguagem artificiosa. Também um ponto de atenção é o fato de trabalharmos em grupo de forma relativamente independente e lidarmos ao mesmo tempo com um vocabulário médico e científico que reclama um certo rigor; ao deparar com a expressão“birth impairments”, em dúvida quanto ao significado, verifiquei outras ocorrências ao longo do texto e percebi que as traduções oscilavam entre complicações no parto e deficiência congênita, que uma pesquisa mostrou ser o correto. De minha parte, devo admitir que não sendo usuário do aplicativo usado na comunicação, fiquei de certa forma afastado das discussões.     

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